E pegou o lápis e pôs-se a escrever:
Estou decepcionado comigo mesmo. Minha falta de coragem é a prisão de
minh'alma, é a condenação de minha falta de atitude, o cárcere de minha
existência. Pior ainda. É a ineficiência de meu ser.
Tão breve eu parta, para o raio que parta, nenhuma falta será sentida.
Nenhuma ausência será notada, nenhuma memória será retida.
Por qual motivo nasci?
Se é que estive vivo. Por qual motivo existi?
Quais propósitos cumpri?
Que marcas ou influências deixei?
A quem pergunto? Não sei.
Por que pergunto? Não sei.
Como pergunto? Não sei.
Defunto, não escreve. Pouco pensa. Nada sente. Apenas passa.
E os pais choraram a culpa por não terem observado, os passos e traumas
do filho. Estavam sempre ocupados com as finanças. Pouparam a vida toda.
Diálogos, dúvidas, conselhos e afagos.
Sobre o dom do filho, a tragédia se encarregou de mostrar. Tinha o dom
das palavras, mas para poeta não para advogado.
Ao menos tiveram a dignidade de manter o epitáfio, mesmo sabendo que
aquelas perguntas seriam o lamento e o fantasma de suas vidas.